terça-feira, 27 de março de 2012

INICIATIVA NOTA 1O

FAZENDO A DIFERENÇA

“Você venderia o seu voto por qualquer benefício?” A ousada pergunta não foi feita em uma conversa entre amigos, e sim em uma atividade escolar. Felizmente, a grande maioria dos estudantes, 91%, respondeu “Não”. Esta foi uma das questões apresentadas por um grupo de professores a estudantes da cidade de Diamantina, em Minas Gerais. A iniciativa foi uma tentativa de formar a consciência política dos alunos, um desafio e uma necessidade para os docentes em geral.
Percebendo a falta de participação e o desinteresse pela coisa pública, professores e bolsistas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid) – vinculado à licenciatura de História da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) – resolveram contribuir para a mudança desta atitude generalizada com formas de trabalho participativas e originais.
Com práticas de caráter inovador dentro da escola pública, eles deram início, em abril de 2010, a um projeto que busca maior interação dos alunos com o ensino deHistória na Escola Estadual Professor Gabriel Mandacaru, em Diamantina, na região do Alto Vale do Jequitinhonha. Oitenta e seis alunos do primeiro ano do ensino médio foram divididos em três turmas, para que pudessem participar de jogos, palestras e exposições que faziam parte do projeto. Logo deu para perceber – pelas perguntas formuladas aos orientadores – que os estudantes tinham interesse e conhecimento prévio do assunto.
Fazer com que os estudantes incrementassem suas noções sobre política, compreendessem a dinâmica das eleições no Brasil e reconhecessem a importância da participação política como forma de entender as mudanças na sociedade eram alguns dos objetivos do projeto. Para cumpri-los, os organizadores, antes de qualquer coisa, recorreram a documentos que legitimassem esta prática. Um deles, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9394/96), diz que os currículos escolares deveriam, entre outras coisas, abranger o conhecimento da realidade social e política do Brasil. Esta recomendação serviu de base para as reflexões da equipe do Pibid e reforçava a ideia de que a escola poderia ser, de fato, uma das instituições responsáveis pela formação política ao incentivar participações no colegiado, em conselhos, grêmios etc.
A primeira atividade do projeto foi uma rápida enquete que continha três perguntas sobre o voto, para que se pudesse verificar como cada aluno se posiciona em relação à questão. O resultado da pesquisa foi discutido e divulgado em toda a escola. Em seguida, a turma foi dividida em dois grupos para a realização de um jogo educativo no qual o objetivo era relacionar cargos e funções dentro dos três poderes. Cada grupo recebeu fichas com os nomes dos cargos – prefeito, vereador, secretários –, e as funções estavam descritas em um quadro maior. Foi estabelecida uma pontuação para cada resposta correta, e, no fim, todos os alunos receberam um prêmio simbólico.
Também despertou muito o interesse dos alunos um espaço de visitação montado no pátio da escola – que contou com a participação efetiva deles em sua organização. Essa exposição recebeu o nome de “OEstadobrasileiro, cidadanianoBrasil, olongocaminho”. Com isso, eles puderam conhecer um pouco da trajetória da cidadania brasileira e do voto em uma mostra cujos blocos haviam sido previamente definidos: Colônia, Império, República Velha, Getulio Vargas, governos populistas, ditadura militar e redemocratização. Além disso, os alunos tiveram a oportunidade de conhecer a urna eletrônica e chegaram a se divertir simulando uma votação. No final, todos assistiram ao vídeo “Eleições 2010”, elaborado pela Justiça Eleitoral e disponível no YouTube.
Os estudantes ainda puderam participar de uma palestra da técnica do Cartório Eleitoral de Diamantina sobre a função dos políticos, os tipos de voto, e o quanto é importante saber escolher os representantes, e de uma roda de debates sobre as propostas dos candidatos à Presidência do Brasil. Ao longo de tantas atividades e discussões, os coordenadores do projeto foram sentindo que havia a necessidade de um registro escrito que reunisse, de maneira simples e agradável, todos os conceitos relativos ao tema, e que pudesse servir de referência para os estudantes.
Com isso, foi preparada uma cartilha que trata, inclusive, da apatia das pessoas em relação à política, que muitas vezes é associada apenas à corrupção. Diante deste quadro, buscou-se instigar os jovens à participação na política. Em seguida, eram didaticamente explicados diversos conceitos, como democracia, política, organização do Estado brasileiro, os três poderes, eleições no Brasil, cidadania, direitos e voto. No final, foram dadas dicas sobre como votar e participar melhor do processo eleitoral, por meio de um texto que incentivava a reflexão e passatempos. Por tratar de um tema tão sério de maneira muito simples, a cartilha acabou tendo uma ótima aceitação.
A experiência foi de enorme valor para todos os envolvidos. Leonides Pinto Filho, aluno do ensino médio, afirmou que “foi bom ter adquirido conhecimento sobre a política do Brasil e entendido o quanto ele é importante nas decisões”. O diretor da escola, Marcelo Marinho, ressaltou que “a forma como o projeto foi executado incentivou tanto os alunos quanto os professores e funcionários, que participaram e se interessaram pelo tema.” As bolsistas Carina P. Lima e Kênia Pereira puderam perceber claramente o quanto os alunos gostaram das atividades que foram desenvolvidas.“Sempre que nos encontram na rua, eles se aproximam e perguntam quando será o próximo projeto. Acredito que essas ideias chegam para renovar as aulas de História e fortalecer a relação entre alunos e professores”, escreveram as educadoras.
Depois de várias reuniões de avaliação, nas quais foram levadas em conta as opiniões dos alunos e de outros professores, constatou-se que o projeto do Pibid não serviu apenas para a formação política dos estudantes. Todo o trabalho desenvolvido, segundo os organizadores, gerou um enriquecimento do ensino de História, enquanto as atividades lúdicas propostas permitiram que se estabelecesse um diálogo melhor entre mestres e estudantes.
Mas nem tudo torna esse tipo de projeto facilmente aplicável em qualquer instituição de ensino. A questão da interdisciplinaridade, por exemplo, é bastante delicada. É difícil envolver professores de outras áreas no desenvolvimento de atividades como as que foram propostas pelo Pibid, seja porque não têm tempo disponível, não acreditam na proposta ou não têm interesse. Outro fator problemático é a carga horária muito limitada, que força as escolas a fazerem vários ajustes para que se consiga realizar tudo o que foi originalmente proposto.
Mas o esforço vale a pena. Ao longo do projeto, um grupo de alunos chegou a ser flagrado na biblioteca conversando sobre os candidatos nos quais cada um iria votar e por quê. Prova de que o projeto, seguramente, lançou sementes que já estão frutificando.

Wellington de Oliveiraé professor da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri. Márcia D. F. Botelho e Maria Tereza Pires são professoras da Escola Estadual Prof. Gabriel Mandacaru.

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